Então você está pensando em correr uma maratona, hein?

Esse texto de 1999 do João Campos é muito bem humorado, mas relata bem o que nós corredores sentimos e passamos.
Muitas vezes abrimos mão das noitadas com os amigos porque no dia seguinte tem corrida ou porque a planilha prevê para o dia seguinte aquele longão que já te dá pesadelos uns 3 dias antes.
Temos que ouvir gracinhas dos chefes e colegas de trabalho, e o pior de tudo, não importa se você já fez umas 20 provas de Triathlon, mais umas 40 maratonas e outras tantas ultras mas não correu ainda a São Silvestre, pra eles é como se você nunca tivesse corrido na vida.

Abaixo um trecho do texto.


Os motivos que faltavam
(11/fev/1999)



Então você está pensando em correr uma maratona, hein?
Não bastam os seus problemas, os seus compromissos, o trabalho, a faculdade, a(o) namorada(o), os filhos, o síndico, o cachorro do vizinho, e você ainda quer correr uma maratona!
Vai se esborrachar treinando durante meses, agüentar sol, chuva, vento, frio, calor, dor aqui, dor ali.
Quando voltar esbagaçado de um treinamento, alguém vai perguntar se você andou fazendo o seu cooperzinho.
Nenhum parente ou amigo vai levá-lo a sério, e alguns até ficarão ofendidos quando você recusar um convite porque tem de treinar.
O médico vai reprová-lo porque você não faz caminhadas, que é muito mais seguro, blablablá, ou natação, que é muito mais completo, blablablá, blablablá.
E quando você finalmente correr o raio da maratona, chegará horas depois do primeiro colocado, rezando para não escorregar naquele tapete de copinhos plásticos e sendo ignorado pelos gatos pingados que sobraram na platéia. Quer saber o que eu penso disso? Ótima idéia!!

Se você já tem o hábito de correr, deve saber que eu não estou exagerando.
Correr é uma mistura sensações boas e ruins. Mais boas, é verdade, mas não venha me dizer que um final de lomba, aquele restinho que você só vê depois que pensou que já tinha acabado, é bom.
É nada. Eu, pelo menos, odeio final de lomba, quase tanto quanto limpar os tênis.

E que tal acordar cedo para correr no domingo? Sair às 19h, noite fechada, 10 ºC e garoando, para fazer os 10 km daquele dia?  Ouvir desaforos de idiotas que passam de automóvel ou, pior ainda, em ônibus de torcedores? Lavar a roupa de corrida quase todo dia, tentando inutilmente desencardir as meias brancas?
Gastar rios de dinheiro em tênis de corrida, que parecem custar só um pouco menos que os automóveis populares? Isso é apenas uma amostra do lado ruim, experimentado por todos os corredores e não apenas por candidatos a maratonista. Mas durante um treinamento para maratona, as distâncias são maiores e todos esses problemas ficam, automaticamente, mais acentuados.

Se você não sabia isso, talvez esteja se sentindo menos motivado. Nesse caso, eu tenho duas coisas a dizer:
Primeiro, não é nada que não possa ser superado, se você tiver disposição e saúde para tanto.
Segundo, são exatamente essas dificuldades que fazem o Desafio.
Eu sei, você pensava que o desafio fosse correr os 42,2 km, mas não é.

Pense num alpinista. Eu gosto da analogia porque, assim como o maratonista não competitivo, o alpinista não tem nada a ganhar, exceto a satisfação de fazer algo extraordinário. Ao chegar ao pé da montanha, o alpinista tem diante de si duas dificuldades básicas. Uma delas é o clima, sobre o qual ele não possui controle algum (mesmo que tenha escolhido cuidadosamente a época da escalada). A segunda dificuldade é a própria montanha. Para enfrentá-la, o alpinista deverá ter aprimorado a sua habilidade como escalador, ajustado o seu condicionamento físico, adquirido todos os equipamentos e víveres necessários e estudado as rotas, os obstáculos e os possíveis locais de acampamento. Nada disso é fácil, mas se tiver atendido cada um desses pré-requisitos, chegar ao cume será apenas uma conseqüência natural (abstraindo-se, é claro, as ocorrências de clima adverso e acidentes imprevisíveis).

A mesma coisa acontece com a maratona. Chegar ao fim de uma não é uma tarefa fácil, assim como não é escalar o Aconcágua. Mas o seu sucesso depende quase exclusivamente da preparação, que é muito mais difícil, porque leva meses ou até anos. Também pode-se imaginá-la como uma formatura universitária: a cerimônia pode até ser longa e cansativa, mas o duro mesmo é ser aprovado em todas as disciplinas.
Então, o desafio maior é concluir satisfatoriamente a preparação, e não apenas terminar a maratona.

Ter uma clara consciência desse fato é o que pode levá-lo em boas condições à linha de chegada. Saber que o verdadeiro desafio é realizar cada um dos treinos programados lhes atribui um significado muito maior do que o de uma corridinha descompromissada de fim de semana (ou cooperzinho, como preferem os idosos).
Ao entender isso, você dará aos seus treinos uma importância semelhante à que dá ao seu trabalho, ao qual você não costuma faltar só porque não está muito a fim. Aliás, você nunca sequer cogita de não ir trabalhar, a não ser que esteja realmente doente.

O texto completo pode ser visto aqui.

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